Unicórnios Latino-Americanos, Recalls Autônomos, Data Centers sob Ataque e a Guerra dos Brinquedos
Bom dia! Hoje é 26 de dezembro. Neste mesmo dia, em 1974, a União Soviética lançava a sonda Salyut 4, inaugurando uma nova era de estações espaciais habitáveis. Cinquenta anos depois, a corrida deixou de ser pelo espaço sideral e passou a ser pelo espaço digital: quem domina os dados, domina o futuro.
Os unicórnios que definem a América Latina
Neste final de ano, o ranking dos principais unicórnios mais valiosos da América Latina nos revela algo além dos valuations bilionários: ele desenha o mapa das apostas estratégicas do continente.
Presentes na lista, Rappi, QuintoAndar, Nubank e seus pares não são apenas startups que deram certo, mas são vetores de transformação que vem causando mudanças em setores inteiros, desde a logística e até a moradia e serviços financeiros. E o fato de o Brasil concentrar a maioria dessas empresas não é mero acaso: mas uma consequência direto de um ecossistema hiper conectado que combina um mercado consumidor massivo e ainda muito carente de soluções práticas, grande capital disponível e uma geração de empreendedores formados para uma era mobile.
Diante deste ranking, o que podemos levar como indicadores para 2026?
Primeiro, que o modelo super app tende a se consolidar cada vez mais, afinal, vemos cada vez mais empresas que começaram resolvendo um problema específico (como a 99, por exemplo), agora, expandindo horizontes e oferecendo ecossistemas completos de serviços.
Segundo, que a competição por talento e capital vai se intensificar cada vez mais, pressionando startups menores a escolherem entre nichos defensáveis ou consolidação.
Terceiro, e mais importante: a próxima safra de unicórnios provavelmente virá de setores ainda subdigitalizados, como os de setores de saúde, agronegócio, educação - onde a ineficiência ainda é regra.
A mensagem estratégica em face do que foi exposto é clara: quem quiser entender o futuro econômico da América Latina precisa acompanhar esses players no agora, pois eles não apenas respondem ao mercado - eles o moldam.
Robotáxis em recall: o preço da escala antes da maturidade
A Zoox, subsidiária da Amazon, emitiu um recall de software afetando 332 veículos após identificar manobras problemáticas em seus carros autônomos, como cruzamentos de faixa em interseções e bloqueios de faixas de pedestres. Na mesma semana e, de modo semelhante, a Waymo precisou dar explicações do por que seus robotáxis travaram durante um apagão em San Francisco, que, devido há um novo sistema de “verificação de confirmação”, criado para garantir segurança, se tornou motor para um gargalo de tráfego quando milhares de semáforos apagaram simultaneamente.
Os dois episódios expõem uma tensão estrutural na recente indústria de veículos autônomos: a corrida para escalar operações comerciais antes que os sistemas estejam verdadeiramente prontos para a imprevisibilidade do mundo real.
A própria Zoox já identificou cerca de 62 incidentes de cruzamento de faixa entre agosto e dezembro. Por sua vez, a Waymo, apesar de seus veículos terem atravessado com sucesso mais de 7.000 semáforos apagados, viu sua reputação manchada pelos recentes casos em que falharam.
Diante destes incidentes, a transparência de ambas as empresas, com recalls voluntários, blog posts explicativos, é louvável e evidente, mas não elimina o fato de que estamos testemunhando um tipo de beta test público com consequências potencialmente fatais.
Com o avançar de casos semelhantes, o impacto regulatório sob estas empresas, com o tempo, será inevitável. Por exemplo, o serviço nacional de transito americano já investiga a Zoox desde março. A pergunta que paira sobre 2026 é, portanto: quanto tempo será necessário até que um incidente grave force uma moratória temporária? E, mais profundamente: a sociedade está disposta a aceitar que máquinas cometam erros que, em humanos, seriam considerados negligência? A resposta definirá não apenas o futuro dos robotáxis, mas o próprio contrato social da automação.
O ano em que os data centers saíram dos bastidores
Em 2025, os data centers deixaram de ser a infraestrutura invisível da tecnologia para se tornarem alvo de atenção midiática, financeira e, recentemente, até mesmo de protestos populares. Nesta semana, os Estados Unidos presenciaram 142 grupos ativistas em 24 estados que organizaram contra novos projetos de data centers.
A razão das revoltas é visceral: as contas de luz dos cidadãos estão subindo, comunidades inteiras foram transformadas em seus territórios sem nenhum tipo de consulta, e a percepção de que os ganhos oriundos da IA ficam privatizados apenas no Vale do Silício, enquanto os custos são socializados a todos.
Os números são impressionantes. Desde 2021, os gastos com a construção de data centers cresceram 331%. Centenas de bilhões de dólares estão sendo despejados em projetos que, segundo especialistas, sequer poderão ser todos construídos - dada a limitação de energia disponível. O Stargate Project, anunciado pela administração Trump, prometeu uma “reindustrialização dos Estados Unidos” via IA; mas o que muitos americanos viram foi a industrialização de seus quintais particulares sem nenhum tipo de contrapartida.
Há uma certa lição aqui para o Brasil, que vem buscando se posicionar como hub de data centers na América Latina: a licença social para operar não é automática. Projetos que ignoram comunidades locais, sobrecarregam redes elétricas sem investimento adequado em geração renovável, ou prometem empregos que nunca se materializam, enfrentarão resistência crescente. A tecnologia pode até ser global, mas a política é sempre local. Empresas e governos que entenderem isso primeiro terão vantagem competitiva; os que não entenderem, enfrentarão os mesmos protestos que hoje bloqueiam US$ 64 bilhões em projetos nos Estados Unidos.
Mattel vs. Hasbro: a guerra que não é só sobre brinquedos
Enquanto o mundo tech debate IA e data centers, uma batalha silenciosa se desenrola no varejo tradicional: Mattel e Hasbro, grandes fabricantes americanas de brinquedos, disputam não apenas o Natal, mas Wall Street. A Mattel, impulsionada pelo fenômeno Barbie e uma estratégia agressiva de licenciamento, reconquistou um terreno anteriormente perdido. A Hasbro, dona de Transformers e Monopoly, aposta em franquias de “transmídia” e jogos digitais.
Com estes recentes passos e mudanças de estratégia, os investidores vem observando este mercado de perto. Afinal, essa disputa em si é apenas um microcosmo de uma pergunta maior: empresas de produtos físicos ainda conseguem competir na economia da atenção?
A resposta para está pergunta e, o mais interessante neste caso, é que ambas as empresas estão, cada uma a seu modo, se tornando empresas de tecnologia. A Mattel investe cada vez mais em experiências digitais conectadas aos brinquedos físicos. A Hasbro expande seu portfólio de jogos eletrônicos à apostas em NFTs e metaverso. A fronteira entre “empresa de brinquedos” e “empresa de entretenimento digital” se dissolve. O produto físico, nos tempos atuais, se torna cada vez mais uma porta de entrada para ecossistemas digitais - e o valor real migra do plástico para o software.
Diante do exposto, para investidores e analistas, a mensagem é: não subestime setores “tradicionais”. A transformação digital não elimina indústrias antigas, ela as reinventa. E, frequentemente, quem vence essa reinvenção são os incumbentes que souberam se adaptar, não os disruptores que os subestimaram.










