O Ponto de Menor Resistência
O mercado não se move em linha reta. Ele pulsa. Consolida, fragmenta, consolida de novo. E, nesse vai e vem, sempre que um gigante se acomoda, um desafiante aparece para cutucar exatamente onde dói. Não é força bruta. É estratégia. Não é sobre vencer o incumbente inteiro, mas encontrar o ponto de menor resistência e puxar o fio certo para desfazer o novelo inteiro.
Foi assim com o Nubank. Há uma década, os grandes bancos pareciam muralhas intransponíveis. Taxas, agências, pacotes, burocracias. O sistema era sólido demais para ser atacado de frente. Mas havia ali uma fresta: os cartões, negligenciados e mal tratados. O Nu entrou por essa brecha e, ano após ano, foi alargando o espaço, até redesenhar o setor como um todo.
O iFood fez um movimento parecido. A empresa percebeu que, para um restaurante, o verdadeiro gargalo não estava apenas no dinheiro, mas na falta de precisão dos bancos tradicionais. Diegos Barreto definiu bem: o modelo clássico é o “banco das médias”. Como os bancos não têm dados operacionais, tratam todos os restaurantes como se fossem iguais. A média é a régua, e ela costuma ser injusta. Surgiu então o iFood Pago, o “banco dos restaurantes”, que passou a oferecer crédito com base em algo que nenhum banco enxerga: a vida real daquele negócio. Giro, ticket, frequência, capacidade, sazonalidade, operação. Uma lupa que substitui a régua.
A Prosus parece ter entendido rapidamente o poder desse playbook. Sua investida mais recente, a Decolar, está lançando o “banco dos hotéis”. O movimento é quase um espelho do iFood Pago, mas aplicado à hotelaria. Hotéis também sofrem com o tal “banco das médias”. É tudo igual no Excel: mesma taxa, mesmo risco, mesmo scoring. Só que, na prática, um hotel que lota de segunda a quinta não tem nada a ver com outro que vive de turismo de fim de semana. Sem dados operacionais, a diferença desaparece. E aí quem é excelente paga o preço de quem é mediano.
A grande virada é justamente essa: iFood e Decolar não são apenas plataformas de serviço. Elas se tornaram sistemas operacionais dos seus mercados. Operam junto, conhecem profundamente o pulso do negócio, entendem suas marés e suas ressacas. Quem opera vê o que o banco não vê. E quem vê melhor, decide melhor.
O “banco das médias” olha todo mundo de cima. O “banco do setor” olha de dentro. É por isso que, ao capturar dados operacionais - e não apenas financeiros - essas empresas podem construir soluções mais inteligentes e mais customizadas. Elas não emprestam baseado no que a empresa é. Elas emprestam baseado no que a empresa faz.
E esse é o novo jogo: encontrar o ponto de menor resistência em mercados gigantes, entrar por ele e reconstruir a lógica do setor de dentro para fora. O Nubank fez nos bancos. O iFood fez nos restaurantes. A Decolar tenta fazer nos hotéis. Amanhã, será qual indústria?
O próximo grande player não vencerá por força. Vencerá por precisão.





Excelente abordagem, Borneli!